O litoral alentejano constitui-se como um dos últimos redutos de costa selvagem da Europa, dado que as suas características naturais, nomeadamente, as geológicas e oceanográficas, não incentivaram, no passado, uma ocupação humana de relevância. Na sua esmagadora maioria, o trecho costeiro em análise é composto por litorais expostos, sujeitos à elevada energia das ondas do Atlântico, ao vento, aos ataques marítimos, para além de, em geral, serem constituídos por solos muito pobres. Estes factores conjugados contribuíram para que as populações se afastassem dessas zonas, preferindo os litorais abrigados, com condições favoráveis à pesca, à salinicultura e à agricultura, enquadrando-se neste âmbito os Estuários do Sado e do Mira. A ocupação dos litorais abrigados deste trecho costeiro remonta aos tempos pré-romanos, tendo sido paulatinamente reforçada pelo avanço da Reconquista, pela necessidade de ocupação dos territórios recém-conquistados. Acresce a preocupação da defesa costeira, designadamente dos ataques de pirataria e corso. Paralelamente à pacificação e defesa do território verificou-se um progressivo crescimento demográfico (até aos séculos XIV-XV), implicando novas necessidades económicas, nomeadamente na agricultura, com o consequente fenómeno de desmatamento e aumento da procura de bens de primeira necessidade, de que são exemplo o pescado e o sal. Como resultado, verificou-se uma intensificação do comércio, sobretudo o efectuado por via marítima. O período do domínio filipino foi igualmente relevante para o litoral em apreço já que a defesa do país passou a estar centrada na fronteira marítima mais do que na terrestre, por receio dos ataques holandeses e ingleses. Nem a moda de “ir a banhos de mar”, registada um pouco por todas as zonas costeiras da Europa a partir de meados do século XVIII, nem tão-pouco o crescimento do turismo português, especialmente na costa algarvia, a partir dos anos 60 do século passado, se reflectiu num grande incremento da ocupação da costa litoral alentejana. Esta estava favorecida, primeiro pela classificação como Zona de Paisagem Protegida (MPAT, 1988) e, posteriormente, como Parque Natural (MARN, 1995). Não obstante, no início do século XXI registou-se uma modificação desta tendência e o Alentejo litoral viu a sua ocupação subordinpada aos interesses económicos, nomeadamente à aprovação de alguns projectos de ocupação turística, os quais constituem uma ameaça à grande parte do património natural, conduzindo consequentemente ao desaparecimento do último reduto de costa selvagem europeia.
The littoral of Alentejo is one of the last strongholds of wild coast in Europe. In the Past, its adverse natural (e.g., geological, oceanographic)characteristics not encouraged human occupation with much relevance. In general, this coastal stretch is widely exposed to the Atlantic high energy waves, strong winds, corsair and pirate sea attacks, besides soils are often very poor. These and other factors contributed to human populations were not attracted by the generality of this coast. Settlements were preferentially concentrated in sheltered coasts (estuaries) where favorable conditions for fishing agriculture and salt production did exist: this means mainly the Sado and Mira Estuaries. The occupation of sheltered areas dates back to pre-Roman times, having been gradually reinforced by the advancement of Reconquista (reoccupation by Christians of territories conquered by Islam some centuries ago). The need for occupation of the recently conquered territories was reinforced by the concern over the corsair and pirate sea attacks. In parallel with the territory pacification and defence there was a progressive population growth (up to centuries XIV-XV). The increase in population has brought new economic needs, particularly in agriculture (with the ensuing deforestation and increasing demand for essential goods like fish and salt). The increase in demand has led to an intensification of trade, mainly carried out by sea. The period of Philippine domain (1580 e 1640) was equally relevant to the Alentejo’s coast . At that time, the defence of Portugal became more focused on the marine borders than on land (for fear of Dutch and English sea attacks). Neither the fashion of “go to sea bathing” (found in many coastal areas of Europe from the mid-18th century) nor the Portuguese tourism growth (especially in the Algarve coast, in 60s of last century), reflected in a significant occupation increase of Alentejo costal zone. The classification of this area as “Protected Landscape Area” (1988) and later on as a “Natural Park” (1995) allowed the continuation of some human rarefaction in this zone. However, some strong touristic occupation does exist, which is mainly concentrated in protected coasts (Sado and Mira estuaries and Bay of Sines, and their expansion areas). At the beginning of the 21th century the adoption of new legislation allowing the development of Projects of National Interest (PIN) if large investments (millions of euros) are guaranteed can lead to a reverse in a situation resulting from many centuries of history. Some of these touristic projects have already been approved. If coastal management agencies do not have enough careful and precaution actuation, and if short-term economic interests win over natural heritage values, sustainable development of this whole coastal area is at risk. This can lead to the disappearance of the last bastion of the wild coast of southern Europe.